Quarta-feira, 6 de maio de 2009
BR 319 E A MILITARIZAÇÃO DA AMAZÔNIA
A discussão fez parte da agenda das audiências públicas promovidas pelo Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), quando recentemente, por força de lei, realizou 04 audiências públicas nos estados do Amazonas e Rondônia, pautando a discussão sobre os Estudos de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) relativo à pavimentação da BR 319 (Manaus-Porto velho), momento em que a sociedade civil organizadas participou efetivamente dos debates, indagando sobre os instrumentos de controle a serem efetivados pela política de governança ambiental proposta no EIA/RIMA, assim como a justificativa política que ampara a construção ou pavimentação das BRs. Quanto à política, o EIA/RIMA da BR 319 assenta suas ações na concepção da geopolítica da integração fundada na logística do mercado expansionista do sul/sudeste, centrando suas coordenadas operacionais no segundo batalhão de engenharia do exército, militarizando as formas de controle e vigilância ambiental, contrariando a prática democrática das instituições efetivas que regulam a política de governança ambiental. Para melhor esclarecer esse processo de militarização da Amazônia recorrem-se aos fatos documentados na obra do Diretor de Antropologia do Centro de Pesquisa de Cambridge (Massachusetts), Shelton Davis, autor de “Victims of the Mircacle” publicado em 1977, em Nova York, com tradução em português, em 1978. O autor analisa as estratégias integracionistas da ditadura militar aliadas com os interesses das empresas multinacionais, provocando impactos e perdas irreparáveis tanto para o meio ambiente como para as populações tradicionais. Leio o texto, conhecendo os feitos do milagre brasileiro e os santos beneficiados:
Em outubro de 1970, o Governo Brasileiro começou a construir várias estradas pioneiras atravessando a Bacia Amazônica. Antes dessa data, existiam na Amazônia duas estradas principais: a BR-010, ou Rodovia Belém-Brasília, correndo de norte a sul nas bordas ocidentais da Amazônia: e a Rodovia BR-364, ligando Cuiabá a Porto Velho. Em 1970, o Governo Brasileiro começou a construir mais três estradas na Bacia Amazônia: a Transamazônica, com 5 mil quilômetros, correndo de leste a oeste através da Amazônia, do Nordeste do Brasil à fronteira com o Peru; a BR-165, ou Rodovia Santarém-Cuiabá, de norte a sul, atravessando a região Centro-Oeste; e a BR-174, ligando Manaus a Boa Vista (Roraima) ao longo da fronteira setentrional com a Venezuela e a Guiana. Com a exceção da BR-174, todas essas estradas estavam em 1974. Vários fatores explicam a rapidez com que o Brasil foi capaz de construir essa rede de estradas através da Bacia Amazônia. Um dos fatores mais importantes foi o papel que o Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) assumiu no planejamento do maciço programa brasileiro de construção de estradas. O DNER foi reorganizado em 1969 e, imediatamente, começou a traçar planos para a integração de toda a rede rodoviária federal. De acordo com um documento divulgado pelo Ministério dos Transportes, o principal objeto do DNER era “formar uma rede unificada de estradas na qual seriam levados em conta os interesses civil e militares visando à integração nacional”. Em 1972, o DNER era um dos mais modernos órgãos estatais em seu gênero na América do Sul. Talvez mais do que qualquer outro país, o Brasil estava burocraticamente preparado para construir uma rede rodoviária através da Bacia Amazônia. Em segundo lugar, os batalhões de engenharia do Exército brasileiro desempenharam importante papel na construção da grande rede rodoviária amazônica. Desde o início, o programa rodoviário da Transamazônica foi um esforço militar. A partir de 1970, o Segundo Batalhão de Engenharia do Exercito começou a construir estrada, deitar trilhos, armar linhas de comunicação e construir instalações sanitárias em toda a Região Amazônica. No decorrer do programa de construção de estradas, essa unidade foi responsável pela consolidação das comunicações por terra entre o Oeste da Amazônia e a Região Centro-Oeste, construindo uma estrada através do Acre até a fronteira peruana, além das Rodovias Manaus - Boa Vista e Santarém-Cuiabá. A grande quantidade de conhecimento técnico, equipamento pesado de terraplanagem e apoio de helicópteros, à disposição dos engenheiros do Exército, mostrou ser inestimável para rápida construção das estradas amazônicas. Em terceiro lugar, nos últimos anos o Governo Brasileiro tem sido extremamente bem-sucedido na obtenção de empréstimos internacionais para financiar seu programa de construção de rodovias federais. Inicialmente, esse programa foi financiado por um Fundo Rodoviário Especial formado com impostos sobre combustíveis e lubrificantes e com empréstimos obtidos à Agência para o Desenvolvimento Internacional, dos EUA (U. S. AID). No final da década de 60, porém, o Governo Brasileiro começou a depender mais de empréstimos internacionais para seu programa de construção de estradas. Entre 1968 e 1972, por exemplo, o DNER recebeu um total de 400 milhões de dólares em empréstimos do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco Mundial. Esses foram os maiores empréstimos já feitos a qualquer país para a construção de estradas na história do Banco Mundial, sendo um fator decisivo para o rápido crescimento da rede rodoviária brasileira. Em quarto lugar, a assistência técnica estrangeira foi extremamente importante na construção da rede rodoviária transamazônica. Uma das principais áreas dessa assistência técnica foi o fornecimento de técnicas modernas de fotografia aérea e reconhecimento por satélite. Já em 1968, por exemplo, a U. S. AID fornecia uma subvenção de 8,4 milhões de dólares ao governo brasileiro para que este participasse do Programa de Satélite de Observação de Recursos da Terra (Earth Resources Observatio Satellite Program - EROS) dos Estados Unidos. Em 1970, o Governo Brasileiro anunciou o Projeto RADAM (Radar Amazônia), um gigantesco esforço para fotografar e mapear a Bacia Amazônica. A maior companhia estrangeira envolvida no Projeto RADAM era a Divisão de Serviço Aéreo da Litton Industries, dos Estados Unidos. Em colaboração com a Goodyear Corporation e vários órgãos governamentais e firmas brasileiras, a Litton realizou um mapeamento aéreo detalhado de toda a hidrologia, geologia, geografia, distribuição de florestas e vegetação da Bacia Amazonica. Um jornal citou essas palavras do presidente da Divisão de Serviço Aéreo, em 1972: “O trabalho da Litton no Brasil para o projeto RADAM, em associação com a LASA, principal firma de engenharia civil do país, realizou em menos de um ano o que teria levado um quarto de século para ser feito por expedições de levantamento convencionais.” Finalmente, várias companhias multinacionais da Europa e dos Estados Unidos forneceram ao Governo Brasileiro equipamento pesado de terraplenagem para a construção das estradas amazônicas. Entre essas companhias, uma das maiores era a subsidiaria da Caterpillar Tractor Company. Entre 1970 e 1972, a Caterpillar do Brasil vendeu mais de 700 peças de maquinaria no valor de 47 milhões de dólares aos Batalhões de Engenharia do Exercito e as sete companhias privadas contratadas para construir a Transamazônica. Em 1972, a Caterpillar controlava sozinha cerca de 70% do mercado de 125 milhões de dólares da terraplenagem do Brasil. Um executivo da Catterpillar do Brasil disse a um repórter da Business Week que “nosso mercado crescerá, freqüentemente, mais rápido que o PNB de um pais, dependendo de como esse pais aloca seus recursos. Isso é particularmente verdadeiro no Brasil, onde tanto está sendo feito em estradas, aeroportos, mineração e projetos hidrelétricos.” No contexto dos fatores acima enumerados pode-se compreender a situação crítica que as tribos indígenas enfrentaram ao longo das margens das estradas amazônicas. Como se viu em outubro de 1970 a FUNAI assinou um contrato com a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) para a pacificação de tribos indígenas ao longo das Rodovias Transamazônica e Santarém-Cuiabá. De acordo com a FUNAI, havia mais de 5 mil índios vivendo na área dessas estradas, dispersos entre mais de 29 grupos tribais. Doze dessas tribos só tinham contatos esporádicos com a sociedade brasileira. Muitas outras eram hostis às intromissões externas e haviam conseguido expulsar estranhos, no passado. Duas primeiras tribos a serem pacificadas pela FUNAI foram os Parakanân e os Kreen-Akarore. É instrutivo considerar o que aconteceu com essas tribos em conseqüência da política da FUNAI e da construção das estradas.
sábado, 6 de fevereiro de 2010
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Um comentário:
Betão, não entendi.
Este artigo é de agora ou de maio de 2009 ?
Vc pode esclarecer?
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