INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES
Renan Albuquerque, na edição de Amazonas em Tempo de 20 de abril do corrente, reportou o conflito decorrente da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Além de equívocos e impropriedades decorrentes da falta de conhecimento sobre o tema, transcreveu, fora do contexto apresentado, o que alterou o sentido, algumas colocações que fiz, há duas semanas. Com isso, em vez de informar e esclarecer, induz ao erro e à criação ou ao agravamento de conflitos. Só hoje tomei conhecimento do texto. Não vou realizar esforço para contrapor-me aos débeis, pouco consistentes e mal-intencionados argumentos apresentados pelo “repórter”, porém, para evitar mal-entendidos, bem como para esclarecer minha posição pessoal sobre o assunto, teço as seguintes considerações:
hoje, por acaso, é 22 de abril. A invasão da América pelos europeus foi brutal, causando o massacre de milhões de seres humanos. Massacre no sentido mais amplo, incluindo não apenas a eliminação física de quem resistia, mas a escravidão e a busca da completa dominação cultural, econômica, social e religiosa dos sobreviventes. Tudo em nome da fé e do ouro.
Porém a razão diz que não nos cabe o papel de juízes da história, mas o de analisar os fatos, verificar suas implicações para a sociedade atual e, uma vez que aquele padrão de conquista é incompatível com os padrões éticos e morais de hoje, sustá-lo se estiver ocorrendo, bem como impedir que algo similar venha a se realizar no futuro.
A razão também nos lembra que o tempo é um processo irreversível. Não há como fazer “os brancos” refluir para a Europa e “os negros” para a África. Ainda mais que dos originais sobraram bem poucos, fruto do intenso processo de mestiçagem que caracterizou a formação de nosso povo. Realizada a análise de nossos genes, descobriremos que somos a maior nação mestiça/indígena do mundo, grupo no qual me incluo.
Por sua vez os índios, exceto pequenos grupos dispersos nas profundezas da selva, buscam as soluções da medicina civilizada e, os conhecendo, desejam acesso aos confortos e facilidades da vida moderna. Aspiração a uma vida melhor é inerente ao ser humano.
Entretanto, uma das idiossincrasias humanas é que alguns dos ditos homens se recusam a enfrentar o mundo real, passando a desenhar “utopias” e viver em delírio. Permanecem cegos frente às principais características da atualidade, como o crescimento exponencial do conhecimento, a integração, a queda de barreiras e fronteiras, a mudança e a evolução acelerada bem como o inevitável corolário, aqueles que não se adaptam fenecem. Os índios não podem voltar a viver como nossos ancestrais, no neolítico ou no paleolítico, sob pena de desaparecerem ou se transformarem em parias, vivendo em estado de indigência nas periferias da sociedade. Quem afirma estar protegendo, na verdade trabalha para exercer a dominação e é o guia para a catástrofe.
Outro grupo que exerce influência é o daqueles que, sob a máscara de amigos da preservação das diversas etnias, na verdade trabalha para interesses estrangeiros, das nações dominantes que, com visão neomalthusiana, querem preservar os recursos naturais para as futuras gerações DELES. Quem considera essa afirmação um delírio, preste atenção no que dizem, explicitamente e há décadas, lideres políticos, formadores de opinião, autores e ONGS – mormente europeus e norte-americanos – sobre o assunto. E as etnias indígenas serão muito mais facilmente dominadas ou neutralizadas se mantidas em estado de fragilidade. Convém lembrar que a verdadeira crise do petróleo se avizinha, e que as nações poderosas nunca tiveram e continuam a não ter pudores em se apossar daquilo que precisam ou desejam.
Considere-se, ainda, o grotesco conteúdo da noção de segregação, que é étnica, cultural, social e econômica, chocando-se contra o livre-arbítrio inerente ao ser humano, uma vez que imposta. Deixem o índio decidir sua vida, o que e como produzir, com quem se relacionar ou a quem se unir. Obrigatório, apenas, é não deixar de informá-lo sobre o mundo atual, e da imposição – que não é nossa, mas da vida – de continuar o processo adaptação, pois não é possível congelar o tempo. Não há mais lugar para santuários, que o digam o Tibet, os iraquianos, os bosquímanos, os curdos e todas as outras nações dominadas por americanos, europeus e russos.
Não cabe aos brasileiros atuais, praticamente todos mestiços, descendentes em sua maioria dos brancos pobres que também vieram para ser explorados, dos índios “absorvidos” e dos negros escravizados, culpa pelo “pecado original” da ocupação cruenta da terra, nem da escravidão. Cabe, isto sim, realçar formas de integração que não se caracterizem pelo alcoolismo, uso de drogas, mendicância submissão ao crime organizado – que está chegando com a plantação de coca - ou à arrogância dos poderosos que exploram. Inspiremo-nos no padre Vieira e em Rondon, e trabalhemos para neutralizar as tentativas de introduzir a segregação racial, cultural, social e econômica em nossa terra.
Que os índios possam recuperar a auto-estima, que continuem a se integrar – quando o desejarem e com dignidade – à nossa sociedade, para que possam desfrutar das boas conquistas da civilização, como saúde, mesa farta, comunicações, mobilidade e conhecimento. Que nos reforcem, para juntos enfrentarmos as mazelas dessa referida civilização. Que possam desfrutar das riquezas da terra e do que nela produzirem, para que possam ser responsáveis por si mesmos, saindo da abjeta situação de “incapazes” e dependentes. Que conheçam os direitos humanos, entre eles o da não-segregação, para que possam desfrutá-los integralmente, o que só será possível através da educação e da participação.
Cabe ao povo brasileiro em geral, e aos índios em particular, tomar conhecimento do contexto em que vivemos e, até mesmo como forma de garantir a sobrevivência, insurgir-se contra histerias pseudo-científicas, mentiras consolidadas, interesses espúrios e políticas autodestrutivas! Já passa da hora de dizermos NÃO à segregação travestida de preservação, ao obscurantismo mascarado de progressista, à condenação a extinção camuflada de proteção, à fraude e à mentira disfarçadas de ciência!
Finalizando, ainda que não seja autorizado a falar em nome do Exército, mas como cidadão que conhece o tema e esta região, posso afirmar que essa Instituição, seguindo a doutrina de Rondon, vêm fazendo, e há muito tempo, muito mais pelas populações indígenas do que aqueles que deveriam trabalhar por elas, mas as usam para testar teorias, dominar, enganar e explorar. Sem contar que os militares sempre trataram essas populações com o respeito devido a cidadãos e a irmãos de armas, pois, desde as origens da Força Terrestre, índios, negros e brancos compartilham o alojamento, o rancho, o riso, o suor, as lágrimas. E principalmente porque, sempre que necessário, misturaram – literalmente - o sangue, na imolação da vida cumprindo o sagrado juramento de defender a Pátria. De minha parte, tenho feito o máximo possível para cooperar com esses irmãos, na fase difícil que atravessam, como podem comprovar muitos amigos, etnicamente índios, que, para minha honra e felicidade, possuo.
PELO FIM DA DOMINAÇÃO, DA MENTIRA E DO RACISMO! SOMOS TODOS IRMÃOS, FILHOS DO MESMO PAI E DA MESMA PÁTRIA!
Manaus, 22 de abril de 2008
César Augusto Silva Beheregaray
Brasileiro, mestiço
Renan Albuquerque, na edição de Amazonas em Tempo de 20 de abril do corrente, reportou o conflito decorrente da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Além de equívocos e impropriedades decorrentes da falta de conhecimento sobre o tema, transcreveu, fora do contexto apresentado, o que alterou o sentido, algumas colocações que fiz, há duas semanas. Com isso, em vez de informar e esclarecer, induz ao erro e à criação ou ao agravamento de conflitos. Só hoje tomei conhecimento do texto. Não vou realizar esforço para contrapor-me aos débeis, pouco consistentes e mal-intencionados argumentos apresentados pelo “repórter”, porém, para evitar mal-entendidos, bem como para esclarecer minha posição pessoal sobre o assunto, teço as seguintes considerações:
hoje, por acaso, é 22 de abril. A invasão da América pelos europeus foi brutal, causando o massacre de milhões de seres humanos. Massacre no sentido mais amplo, incluindo não apenas a eliminação física de quem resistia, mas a escravidão e a busca da completa dominação cultural, econômica, social e religiosa dos sobreviventes. Tudo em nome da fé e do ouro.
Porém a razão diz que não nos cabe o papel de juízes da história, mas o de analisar os fatos, verificar suas implicações para a sociedade atual e, uma vez que aquele padrão de conquista é incompatível com os padrões éticos e morais de hoje, sustá-lo se estiver ocorrendo, bem como impedir que algo similar venha a se realizar no futuro.
A razão também nos lembra que o tempo é um processo irreversível. Não há como fazer “os brancos” refluir para a Europa e “os negros” para a África. Ainda mais que dos originais sobraram bem poucos, fruto do intenso processo de mestiçagem que caracterizou a formação de nosso povo. Realizada a análise de nossos genes, descobriremos que somos a maior nação mestiça/indígena do mundo, grupo no qual me incluo.
Por sua vez os índios, exceto pequenos grupos dispersos nas profundezas da selva, buscam as soluções da medicina civilizada e, os conhecendo, desejam acesso aos confortos e facilidades da vida moderna. Aspiração a uma vida melhor é inerente ao ser humano.
Entretanto, uma das idiossincrasias humanas é que alguns dos ditos homens se recusam a enfrentar o mundo real, passando a desenhar “utopias” e viver em delírio. Permanecem cegos frente às principais características da atualidade, como o crescimento exponencial do conhecimento, a integração, a queda de barreiras e fronteiras, a mudança e a evolução acelerada bem como o inevitável corolário, aqueles que não se adaptam fenecem. Os índios não podem voltar a viver como nossos ancestrais, no neolítico ou no paleolítico, sob pena de desaparecerem ou se transformarem em parias, vivendo em estado de indigência nas periferias da sociedade. Quem afirma estar protegendo, na verdade trabalha para exercer a dominação e é o guia para a catástrofe.
Outro grupo que exerce influência é o daqueles que, sob a máscara de amigos da preservação das diversas etnias, na verdade trabalha para interesses estrangeiros, das nações dominantes que, com visão neomalthusiana, querem preservar os recursos naturais para as futuras gerações DELES. Quem considera essa afirmação um delírio, preste atenção no que dizem, explicitamente e há décadas, lideres políticos, formadores de opinião, autores e ONGS – mormente europeus e norte-americanos – sobre o assunto. E as etnias indígenas serão muito mais facilmente dominadas ou neutralizadas se mantidas em estado de fragilidade. Convém lembrar que a verdadeira crise do petróleo se avizinha, e que as nações poderosas nunca tiveram e continuam a não ter pudores em se apossar daquilo que precisam ou desejam.
Considere-se, ainda, o grotesco conteúdo da noção de segregação, que é étnica, cultural, social e econômica, chocando-se contra o livre-arbítrio inerente ao ser humano, uma vez que imposta. Deixem o índio decidir sua vida, o que e como produzir, com quem se relacionar ou a quem se unir. Obrigatório, apenas, é não deixar de informá-lo sobre o mundo atual, e da imposição – que não é nossa, mas da vida – de continuar o processo adaptação, pois não é possível congelar o tempo. Não há mais lugar para santuários, que o digam o Tibet, os iraquianos, os bosquímanos, os curdos e todas as outras nações dominadas por americanos, europeus e russos.
Não cabe aos brasileiros atuais, praticamente todos mestiços, descendentes em sua maioria dos brancos pobres que também vieram para ser explorados, dos índios “absorvidos” e dos negros escravizados, culpa pelo “pecado original” da ocupação cruenta da terra, nem da escravidão. Cabe, isto sim, realçar formas de integração que não se caracterizem pelo alcoolismo, uso de drogas, mendicância submissão ao crime organizado – que está chegando com a plantação de coca - ou à arrogância dos poderosos que exploram. Inspiremo-nos no padre Vieira e em Rondon, e trabalhemos para neutralizar as tentativas de introduzir a segregação racial, cultural, social e econômica em nossa terra.
Que os índios possam recuperar a auto-estima, que continuem a se integrar – quando o desejarem e com dignidade – à nossa sociedade, para que possam desfrutar das boas conquistas da civilização, como saúde, mesa farta, comunicações, mobilidade e conhecimento. Que nos reforcem, para juntos enfrentarmos as mazelas dessa referida civilização. Que possam desfrutar das riquezas da terra e do que nela produzirem, para que possam ser responsáveis por si mesmos, saindo da abjeta situação de “incapazes” e dependentes. Que conheçam os direitos humanos, entre eles o da não-segregação, para que possam desfrutá-los integralmente, o que só será possível através da educação e da participação.
Cabe ao povo brasileiro em geral, e aos índios em particular, tomar conhecimento do contexto em que vivemos e, até mesmo como forma de garantir a sobrevivência, insurgir-se contra histerias pseudo-científicas, mentiras consolidadas, interesses espúrios e políticas autodestrutivas! Já passa da hora de dizermos NÃO à segregação travestida de preservação, ao obscurantismo mascarado de progressista, à condenação a extinção camuflada de proteção, à fraude e à mentira disfarçadas de ciência!
Finalizando, ainda que não seja autorizado a falar em nome do Exército, mas como cidadão que conhece o tema e esta região, posso afirmar que essa Instituição, seguindo a doutrina de Rondon, vêm fazendo, e há muito tempo, muito mais pelas populações indígenas do que aqueles que deveriam trabalhar por elas, mas as usam para testar teorias, dominar, enganar e explorar. Sem contar que os militares sempre trataram essas populações com o respeito devido a cidadãos e a irmãos de armas, pois, desde as origens da Força Terrestre, índios, negros e brancos compartilham o alojamento, o rancho, o riso, o suor, as lágrimas. E principalmente porque, sempre que necessário, misturaram – literalmente - o sangue, na imolação da vida cumprindo o sagrado juramento de defender a Pátria. De minha parte, tenho feito o máximo possível para cooperar com esses irmãos, na fase difícil que atravessam, como podem comprovar muitos amigos, etnicamente índios, que, para minha honra e felicidade, possuo.
PELO FIM DA DOMINAÇÃO, DA MENTIRA E DO RACISMO! SOMOS TODOS IRMÃOS, FILHOS DO MESMO PAI E DA MESMA PÁTRIA!
Manaus, 22 de abril de 2008
César Augusto Silva Beheregaray
Brasileiro, mestiço
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